quinta-feira, 18 de março de 2010

O Dono do Mundo

Capítulos:

1. 1-Prefácio;

2-Lágrimas no mictório;

3-Isobel;

4-TV Tupi;

5-Ouça-me;

6-O dono do mundo;

7- O veredicto;

8- Pulsão de morte.

1. Prefácio

Escrevo este conto, criado por mim mesmo, o autor, que desta vez me fiz de narrador, a fim de ter o poder de passar os fatos tal qual como eu queira. Pergunto a ti, também, para que reflitás, qual ação um homem tem de tomar para conquistar algo ou para ser chamado de “o dono do mundo”. Permita-me ponderar, que seu mundo pode ser seu lar, sua cidade, seu aquário, seu carro ou o planeta Terra. Para mim, creio que não consegui muitas obras neste ciclo de vida e pus-me a considerar que o meu mundo é um livro, por isso resolvi ser escritor, posso dessa maneira sublimar e enfim descansar no último ponto final desta estória, da qual sou mestre.

Construo agora com os objetivos que foram dados a mim, como narrador, a estória de Joaquim. “Apenas crio, mas passo aquilo que possuo”.

Começa:

2. Lágrimas no mictório

A porta entreaberta do apartamento denuncia que o casual não impera sobre aquele dia na vida de Joaquim. Isobel corre pelos cômodos a fim de encontrá-lo e o acha no banheiro, embaixo do chuveiro, em prantos. Não, este não é o primeiro dia que esta cena fica memorizada no consciente dessa mulher, inúmeras vezes teve que retira-lo da ducha, dar um chá de sermão ao jovem e levá-lo a se distrair pelos cantos da capital paulistana.

Joaquim se joga nos braços de sua amiga, chora, conta alguns dizeres, promessas de seu ex-namorado, que se fora sem dar um ‘adeus’. Da mesma forma que criara um mundo de planos com seus outros, resguardava ter mais lembranças com este, ao menos lembranças de um relacionamento que perdurasse por mais tempo, o possível para serem íntimos.


3. Isobel

Isobel pode ser vista como estas mulheres que marcam décadas, mulheres de vanguarda. Indo contra a correnteza familiar, repudiou as Ciências Médicas, e graduou-se em Jornalismo.

De inicio como não conseguia emprego nos jornais, escrevia Ensaios e Críticas e enviava para tais locais. Também era fotógrafa, registrava acontecimentos de cunho policial, depois se aproximou do mundo da moda. Utilizando de ousadia, e dinheiro de seu pai, criou uma mostra de fotos chamada “Depois daquele beijo”. Registrou fotogramas de mulheres soltas no vento, enroladas com papel crepom de várias colorações, que embrulhavam seus seios e vaginas. Por este ensaio ganhou notoriedade e graças a seu artigo “O que é belo?”, consegui emprego na TV Tupi, onde conheceu Joaquim.

O que é belo?

Não há no mundo das idéias proposto por Descartes, o molde de “beleza”, quando se nasce a carga do que se denomina belo, segundo a sociedade que vivemos, não está aderida a mente do ser. Pelo fato que se desta maneira fosse, não haveria mutação sobre o significado visual deste termo, pois se verifica em fatos históricos que mulheres “bonitas” na pré-história eram aquelas de corpo em forma arredondada, com quadris grandes, onde esta característica era tida como a alta capacidade de reprodução. Esta mentalidade se estendeu até a Idade Média, hoje a maneira de se denominar belo em relação à estética corporal é diferente. O que incuti em nós a concretização do ‘bonito’ e ‘atraente’ são os meios de comunicação. Não só a questão edípica proposta pela Psicanálise, mas a subjetividade social nos influência, denotando regras e nos limitando em nossas ações e personalidade.

No entanto não é o próprio homem construtor da sociedade, então esta questão é dialética. O medo de se sentir excluído, o medo da solidão faz-nos seguir a massa.

Com esta estrutura critica foi recebida para editar e finalizar as matérias que iam ser apresentadas no Repórter Esso e causou escândalo interno quando sugeriu a seguinte pauta: Ensino de Artes. Sua idéia foi rejeitada e com um pseudônimo publicou o seguinte ensaio em relação à Educação:

x

(Texto original sobre critica da Educação, relacionado ao Ensino de Artes, escrito por Isobel Mendonça, censurado pelo DOPS em 1970).

4. Ouça-me

Psicóloga: E então, como foi sua semana?

Joaquim: Está pesado para mim!

Psicóloga: Felício. O que aconteceu ainda dói?

Joaquim: Sim, ainda penso nele.

Psicóloga: Sabe que é todo um processo, um sentimento que vai se filtrando com o tempo. Foi uma perda.

Joaquim: Mais uma, mais uma...

Psicóloga: Isso é um jogo, às vezes se perde outras vezes se ganha, tem que estar aberto para isso.

Joaquim: Acho que sempre será assim, eu sofro me martirizando com estas questões.

Psicóloga: Este sofrimento é uma resposta que ocorre mesmo.

Joaquim: Mas já foram tantos. Minha mãe dizia para eu não me envolver com ninguém.

Psicóloga: E sua mãe sofria?

Joaquim: Por meu pai, meu pai a maltratava...

Psicóloga: Da mesma forma que maltratava você?

Joaquim: Sim, como te disse da última vez, queria que ele fosse mais consciente. Que fosse querido com a gente, paciente.

Psicóloga: Ele não se fazia de atencioso?

Joaquim: Sim, ele era. Até muito, mas era uma atenção da qual não queria ser visto. Queria que eu fosse como ele, foi seu único filho com minha mãe. Achava que deveria ser ambicioso, mas não sou.

Psicóloga: Apenas é diferente.

Joaquim: Eu o decepcionei.

Psicóloga: Não credito nisso, não vejo o por quê. Você tem caráter, um emprego, é isso que normalmente os pais desejam para seus filhos.

Joaquim: Meu pai queria que eu fosse grande como ele, que conquistasse as pessoas, continuasse seu império.

Psicóloga: Você usou sua herança para pagar o banco, não?

Joaquim: Sim, se ele não tivesse tido um filho com aquela mulher no Rio. Mas o bastardo conseguiu ficar com metade das terras. E no fim de sua vida, meu pai gastava seu dinheiro com pinga e mulheres.

Psicóloga: E seu pai, como ele conquistou todo este império?

Joaquim: Quer realmente ouvir?

Psicóloga: É uma longa história? Estou aqui para ouvir

Joaquim: Acho que sim, é nem é importante.

Psicóloga: Então quero ouvi-la.

Joaquim: Dessa forma, ouça-me.

5. O dono do mundo

Joaquim: Meu pai era um homem de cabelos brancos, pele um tanto enrugada e com pequenas manchas de Sol. Mas seu porte, seu corpo era de homem pronto a proteger, um ser robusto e forte. Mesmo com a idade de cinqüenta e cinco anos, tinha a vitalidade, presunção e vontade de conquista de um jovem de vinte e cinco anos, a mesma idade que Orson Welles tinha quando dirigiu seu Cidadão Kane. Toda vez que vinha para a capital fluminense, tinha o prazer de ficar olhando o mar, as ondas se quebrando em seus pés. Se fazia intacto observando aquele horizonte distante, aquela imensidão de água. Lágrimas escorriam de seus olhos, tirando a areia que estava sobre sua pele. Guardava em seu bolso direito um relógio e no esquerdo um pequeno porta retrato, a qual nunca me deixou ver.

Minha mãe dizia, que o relógio era para ele jamais perder a hora do Banco fechar e a foto era de uma de suas amantes. Conheci umas dessas, na segunda vez que fui ao Rio e a primeira que assisti uma projeção de cinema, agora entendia o por quê das viagens de meu pai. Foi esta amante, Luiza, que teve um filho seu. Acho que ele é a figura que meu pai desejava que eu fosse. .

No dia de finados, ele novamente me levou a capital e lá me apresentou uma mulher, mais velha que ele. Ela me abraçou, de inicio não compreendi. Fiquei na casa dela e ele saiu. Possivelmente foi se encontrar com sua amante preferida, meu pai apenas amou uma pessoa na vida: esta amante.Era devotado a ela.

A noite, depois de me tratar muitíssimo bem, com um delicioso café da tarde, a mulher veio a mim e revelou sua identidade, era irmã de meu pai. Foi impactante para mim, achava que não tinha mais nem um ente vivo. A partir deste dia, todas as vezes que voltava para cidade grande, era levado até esta casa. E eu e aquela mulher nos demos muito bem. Um dia, conversando com ela, perguntei sobre sua infância, como era meu pai e ela quando crianças e me revelou algo. Pediu que não comentasse com ninguém.

Ela me segredou que meu pai era uma criança dócil, querida, muito ligada a religião e a minha avó. No dia da festa de seus nove anos, sua mãe caiu de febre no chão.

Ficou febril por dias, os médicos não davam uma explicação, um prognóstico e ela sofreu até sua morte. Minha tia falou-me que meu pai rezava incessadamente para que minha avó se curasse, mas não aconteceu.

No dia de seu falecimento, ele se revoltou, fugiu de casa e voltou depois de três dias, todo sujo e com um semblante diferente. A partir daquele dia passou a ser ambicioso e foi conquistando as terras e as pessoas conforme a idade foi passando. Casou-se com minha mãe por interesse, já que seu pai era dono das terras vizinhas a dele. Expandiu seus negócios para o Rio, vendeu café e comprou cinematógrafos para a projeção de filmes, disse que este era um negócio que daria retorno. Ele se intitulava o dono do mundo. Uma vez minha tia perguntou para ele o por quê desta denominação. Ele retrucou, dizendo que não mais acreditava em Deus, que quando precisou, ele não atendeu e que por isso comandaria sua própria vida, conquistando o mundo.

6. Veredicto.

Psicóloga: Joaquim, você se culpa por não ser a figura que seu pai desejava que fosse?

Joaquim: Não sei, mas dói ele nunca ter dito obrigado a mim! De ele estar distante.

Psicóloga: Parece que houve um quebra de sua relação com ele.

Joaquim: Acho que me lembro de algo quando era bem pequeno, de eu estar no colo dele no sofá. Depois isso nunca se repetiu, sempre longe de mim.

Psicóloga: Você é o oposto dele.

Joaquim: Minha mãe criticava muito a conduta que ele tomava. Dizia que não gostava de suas atitudes, então quis assumir a pouse contrário.

Psicóloga: E esta sua conduta não o conquistou, isso não o agradou.

Joaquim: Não. Queria ao menos um pouco de atenção de sua parte.

Psicóloga: Você sofre muito, se mutila, não consegue se ligar a alguém, pois houve um rompimento passado com sua figura paterna.

Joaquim: Mas são meus namorados que somem...

Psicóloga: Mas parece que você tem que se culpar. Se autoflagelar, por nunca ter tido a aprovação dele.

7. Pulsão de morte

Sentado em seu sofá, na penumbra da sala, observava na parede as luzes dos carros que passavam na rua. Joaquim pôs a chorar.

Recordando de seu último encontro com Felício naquele ambiente, a três semanas atrás, pegou o portaretrato no qual tinha uma foto do abraço dos dois.

Caminhou até a cômoda de seu quarto e abriu a última gaveta, de cima para baixo, e o colocou ali, em meio a tantos outros com fotos de seus antigos parceiros.

Voltou até a sala, deitou no tapete central e começou a pensar no que a psicóloga havia lhe dito. A partir daquele instante, iniciou o encaixe de suas ações e o por quê de cometê-las. Como a que fez a três semanas: ouvia Dick Farney, com suas mãos fechou os olhos de seu namorado e pediu que ficasse assim, para que lhe presenteasse com uma surpresa. Foi até a cozinha, abriu a gaveta e de lá retirou uma faca. Deu passos em direção a Felício, beijou seus lábios e lágrimas caíram. Enfiou a faca no centro do ventre de seu parceiro, apenas disse:

-Desculpe.

8. Repressão

Eu perco o chão
Eu não acho as palavras
Eu ando tão triste
Eu ando pela sala
Eu perco a hora
Eu chego no fim
Eu deixo a porta aberta
Eu não moro mais em mim...

Eu perco as chaves de casa
Eu perco o freio
Estou em milhares de cacos
Eu estou ao meio
Onde será
Que você está agora?...

Eu perco o chão
Eu não acho as palavras
Eu ando tão triste
Eu ando pela sala
Eu perco a hora
Eu chego no fim
Eu deixo a porta aberta
Eu não moro mais em mim...

Eu perco as chaves de casa
Eu perco o freio
Estou em milhares de cacos
Eu estou ao meio
Onde será
Que você está agora?...

(Adriana Calcanhotto)

Estas eram as angústias, pelas quais Joaquim passava a cada rompimento de relacionamento. Ele sofria e se dilacerava, se penalizava. Estes rompimentos eram necessários em seu psiquismo, ele precisava punir-se por não ter tido um sucesso social e uma brilhante carreira, os quais seu pai desejou que alcançasse. Dessa maneira, matava seus namorados, para se castigar por não ter conquistado sua figura paterna.

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