quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Dzi Croquettes

“Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio arruivados. Tinha um busto enorme, enquanto nós todas ainda éramos achatadas. Como se não bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com balas. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria.”

.

.

.

Estas eram as palavras pronunciadas por aquela boca, por aqueles lábios grossos e volumosos. E eis que se aproximavam destes, outros vagarosamente. Quando se tocaram, a outra boca, a boca de lábios finos e desenhados por curvas num cubismo, se abriu. A freqüência da respiração aumentou. Os narizes exalaram o cheiro do outro, se sentiram e tocaram-se. Fecharam os olhos. A mão da dona dos lábios finos tateou a fronte do dono dos lábios grossos, apreciou toda textura de sua pele, cada contorno, cada entrada. Alisou os fios de seu cabelo, de suas sobrancelhas e disse:

-Quero você!

Os lábios se encaixaram, as aberturas de seus corpos se dilataram, compreenderam o dilacerante processo de exaltação de seus pêlos. E como se num instante possuíssem a mesma vontade de querer ser felizes, apalparam-se, se desejaram.

Enquanto massageava seu rosto, a mulher fechava seus olhos para perceber o quente da mão deste homem, o cheiro de sua pele e se fazia num estado de extrema excitação.

.

.

.

Estes lábios finos sentem o caminhar lento das palavras, que saem da boca de lábios grossos, vindo numa voz amortecida, aveludada, e se vêem protegidos por isso. Desde quando leu a primeira página de “Dom Casmurro” até o décimo livro, o de Clarice Lispector, imaginava ser ele como Poirot, ou como Molière, ou como Senhor Darcy. Não sabia como ele era fisicamente, apenas sabia que sua voz e seu carinho com as letras a fazia viva, com o pensamento ativo em saber o dia que poderia tocar este homem.

Este homem de lábios grossos se entregou a esta mulher, dando prazer e recebendo. Não teve receio de que ela estivesse apenas o beijando por achá-lo belo pelos contornos de seu corpo, mas porque lhe interessava outras características. Todos estes anos trabalhando como GO GO BOY o fez se restringir ao seu estado físico. E agora sabia que as ações desta, que o contratou para ler livros, pois perdeu o sentido da visão num acidente de carro, eram puras. Naquele dia quis dar um prazer antes nunca proporcionado para uma mulher.

.

.

.

E se fez o amor visível, se fez a atração sem o olhar e se fez o querer pelos pequenos detalhes.

Nenhum comentário:

Postar um comentário